Marco acordou naquele
mesmo beco de Londres, cidade onde vivia, com muitas dores e sem os documentos
ou dinheiro. Junto com seu corpo estava um mendigo com um profundo corte no
pescoço, mas que ainda vivia. Num impulso incontrolável, Marco se aproximou
dele e os cheiros fétidos que pairavam no ar, foram se distinguindo. A podridão
da viela, o suor, a umidade, o lixo e a bebida já não suplantavam um aroma que
até então ele nunca havia sentido com tanto frescor e doçura. O cheiro de
sangue.
Aproximou-se ainda
mais e viu que o homem quase sem vida balbuciava algo incompreensível. Pegou na
mão do indigente, viu que ele piscou num reflexo, mas desta curta distância, o
cheiro do sangue era o único a ser percebido. O sangue vertia e o vermelho
vibrava mesmo na sombra, como se tivesse luz própria, como se as cores se
recompusessem ou até como se Marco estivesse sob efeito de alucinógenos.
Tocou o sangue com a
mão, mesmo temeroso. Sentiu seu calor, sua viscosidade. Seu corpo tremeluziu e
um arrepio percorreu-lhe a cervical. Percebeu também que os músculos de sua
face se contraiam fortemente e que seus olhos viravam. Parecia que iria
convulsionar. O tremor se ampliou quando ainda temeroso levou a mão
ensangüentada à boca e viu passar em sua mente as imagens de todas as doenças,
síndromes e males transmitidos pelo sangue e estudados em sua graduação. Nada
disso importava; tocou a mão com a língua.
Sugou com volúpia o
sangue em sua destra, aumentando assim o tremor, a tensão e o prazer. Sentiu-se
excitado como nunca na vida e olhou rapidamente para os lados enquanto seu
corpo já se inclinava sobre o corpo que sucumbia à ferida. Pôs-se a sugá-lo.
Sentiu que algo lhe
rasgava as gengivas, Afastou o pensamento recorrente das doenças, da ética, da
lei, da ordem e entregou-se ao prazer. O sangue não vertia com tanta pressão
quanto a princípio, então ele aprofundou a ferida, achando a carótida, com seus
novos e enormes caninos. Ao terminar de dilacerar o pescoço do infeliz
moribundo e lamber freneticamente o sangue que ainda lhe escorria pelas mãos,
sentiu novamente uma dor nas gengivas, como se um ciso as rompesse, mas na
direção inversa. A dor lhe trouxe a consciência e a realidade. O que fizera? Só
podia fugir o mais rápido que pudesse e tentar esquecer os fatos funestos dessa
noite londrina.
Nenhum comentário:
Postar um comentário