Não quero mais isso,
não posso mais agüentar essa angustia, tem que haver alguma solução, tem que
existir. Estudei durante longos anos de minha vida em um país distante para aprender
como salvar vidas e agora tudo o que faço é dar cabo delas. Eu vou me entregar
à polícia, vou... Preciso...
Os pensamentos passaram
a ficar cada vez mais desconexos, as lembranças da infância, as saudades do pai
e da terra natal.
Eu tenho que voltar
para casa, tenho que redescobrir quem eu sou.
Saio à rua na
tentativa de que o ar gelado da noite de domingo ou a neblina me tranqüilizem e
dêem para minha vida um caráter de sonho, para que eu possa acordar ileso o
mais rápido possível, mas nada disso acontece. Ando agora sem rumo pelas ruas
desertas de Londres. Já me acostumei a errar por aqui. Mais a frente, percebo
um carro parado com os faróis acesos. O carro não está vazio, ouço vozes e
percebo movimentos apesar da neblina e dos vidros embaçados. Chego mais perto
só para olhar e percebo que um casal de namorados está nas suas preliminares
sexuais. Aquilo me distrai como quando assistia filmes eróticos pela TV, mas ao
passo que me distrai, me excita e o sangue começa a borbulhar dentro de mim causando
uma reação incontrolável.
Minha face agora é
outra e invertem-se os papéis, de expectador atencioso a ator principal. São
apenas alguns passos do muro onde estava encostado até a maçaneta que por
descuido ou volúpia se encontrava sem trava, como se isso fosse me oferecer
resistência nessas condições. Meus olhos já estavam vidrados e o casal
semi-desnudo não tem tempo de esboçar reação. Meu subconsciente manda atacar
primeiro o homem, talvez seja suficiente, talvez eu não tenha que matá-lo,
prometo controlar-me desta vez, mas com um só golpe da destra e a garota já
está jogada, meio para dentro meio para fora e antes que ele completasse seu
nome já não tinha quase garganta para pronunciá-lo novamente.
O sangue jorrou nos
vidros laterais e a garota tentou reagir. Ela me puxava, me empurrava, chegando
a rasgar minha camisa, eu acho, mas eu já estava quase repleto e saciado, não
restava mais sangue circulando em minha vítima e eu poderia ir embora chorar
minha miséria de vida de assassino serial. Mas ao me virar olhei para aquele
colo nu, com sangue escorrendo e toda aquela violência com que ela me atacava,
eu não estava com fome, mas ainda estava fora de controle.
Voei para cima dela e
ela ficou meio tonta ao bater com as costas no painel. Caímos meio sem jeito e
ela puxava meus cabelos tentando resistir num ímpeto de sobrevivência. Logo sua
resistência já havia enfraquecido. Enquanto mordia e sugava um de seus seios
alucinadamente a garota pareceu por um momento trazer-me para perto de si,
puxar-me os cabelos da nuca como que de prazer, entre suaves e fracos gemidos.
Via-me como o rapaz que acabara de destroçar, Richard, se me lembro o que ela gritava.
São tantas vozes, tantos gemidos, tantos espasmos, tantas lembranças...
Fechei meus olhos e
respirei fundo. Ao abri-los novamente a besta já havia me abandonado. Sem a
necessidade de sangue eu retornava a ser o patético Marco de sempre. Chorei copiosamente
por alguns segundos e fugi. Corri com todas as minhas forças pela noite
adentro. Beco após beco, eu queria sumir, queria acabar logo com isso, não
agüentava mais, eu não conseguia me acostumar com a s mortes e os rostos.
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